quinta-feira, 1 de outubro de 2015

ENTREVISTA : OS JOVENS E A ESCOLHA DE CARREIRA

Entrevista concedida a Thayna Iglesias 1. É muito comum os adolescentes não saberem que curso escolher? É não só comum, é natural esse não saber, o estranho seria se soubessem. E mesmo quando o jovem se sente mais preparado para fazer sua escolha, ele vai descobrir que, ao mesmo tempo em que se apoia em alguns saberes para exercer sua escolha, que há, inevitavelmente um campo de não saber com o qual terá que se ver. Na escolha profissional, na vida. 2. Qual o melhor método para escolher uma profissão sem ter que recorrer para um teste vocacional? De nada valem os métodos se não houver o fundamental: um sujeito em condições de fazer sua escolha profissional. Por exemplo, um adolescente que ainda não se encontre capaz de separar-se, distinguir-se de seus pais. Ele certamente não reuniu os pré-requisitos básicos para poder realizar essa tarefa, por mais que a sociedade lhe cobre isso. Por isso temos que ver esse sujeito na sua particularidade. Para todos o caminho vai ser a reflexão acerca de si, essa olhada fundamental para si, para suas identificações, seus interesses, suas aptidões, sua visão de mundo. No melhor dos casos, é tudo isso que canalizamos para nosso papel profissional. Mas para muitos, é preciso contar com uma ajuda especializada, seja uma orientação vocacional ou até mesmo uma psicoterapia, que dê ao sujeito um suporte nesse momento. Ainda sem contar que uma grande parcela de jovens nesse mundo trabalha em condições sub-humanas, e não tem escolha. 3. Os testes encontrados na internet podem ser eficazes em ajudar na escolha do curso? Não digo que não ajudem, como muitos recursos podem ser úteis, a busca de informações, conversas com pais, com professores, com profissionais, e até mesmo testes. Mas como já disse acima, nada disso é o essencial. O essencial está associado com a verdade de cada um. Com essa necessidade de se implicar nesse processo, com a capacidade, a condição de fazê-lo, buscando perguntar-se e, a partir de seus questionamentos, construir algumas respostas, realizar sua escolha. 4. Como uma psicóloga trabalha para ajudar os jovens a descobrirem sua vocação? O trabalho do psicólogo na orientação vocacional tem a marca da formação deste profissional, suas convicções, sua linha, como dizemos. Estou embasada, em meu trabalho, numa abordagem clínica e psicanalítica, o que pressupõe que estamos tratando, nessa clínica, com aquilo que o sujeito não sabe de si mesmo, essa divisão fundamental do sujeito, trabalho com um sujeito dividido entre saber e verdade, entre consciente e inconsciente. Um jovem pode, por exemplo, decidir-se pela Medicina por um desejo de reparar, através de sua escolha, algo de uma ordem inconsciente e que o antecede, que pode ter, por exemplo, relação com a maneira como seus pais sempre se diminuíram, sentiram-se inferiores. Fazer Medicina, para este jovem, e ele não tem consciência disso, é uma via para engrandecer-se. Isto para exemplificar, apenas, e é um caminho que visa que o sujeito se aproprie de suas motivações, principalmente aquelas de ordem inconsciente. Cada caso é um caso, tem suas particularidades, seu tempo, suas questões próprias, é uma caminhada única a ser percorrida pelo sujeito e pelo psicólogo, juntos. 5. Por que muitos acabam escolhendo um curso e se arrependendo depois? É sempre uma possibilidade uma mudança em nosso percurso, a reavaliação de um projeto, de uma direção tomada. A palavra arrependimento nos remete a culpas e pressões, como se houvesse uma resposta única, certa, a ser encontrada. Não se trata disso. É claro que escolher nos coloca frente a riscos e responsabilidades que temos que assumir. Este é o preço de crescer, assumir um lugar de adulto, fazer escolhas. Há sempre perdas a encarar nesse processo. Muitas vezes acontece de o jovem não estar preparado para a escolha, não estar amadurecido para isto, e, como consequência, mostrar uma dificuldade em posicionar-se como sujeito, alienando-se ao desejo dos pais, ao que a sociedade lhe aponta como uma via para ser bem sucedido. A pressão em nossa sociedade para que se atinja esse ideal do mundo contemporâneo capitalista, essa obrigatoriedade de ser feliz, muito bem sucedido, ganhar muito bem, desempenhar-se bem nessa tarefa solitária do homem moderno, de construir-se, inventar-se. Isto não é pouca coisa. E certamente o jovem sofre essa pressão. 6. O que é mais importante levar em conta na hora da decisão? O mais importante é, essencialmente, distinguir, separar, o que é seu em relação ao que é relativo aos pais, à família. Levar em conta, a partir da herança familiar, a sua particularidade, suas próprias tendências, suas habilidades, suas concepções de mundo. Assumir sua diferença. 7. A família influencia muito na escolha do jovem? O importante nesse momento não é deixar de sofrer influências, muito pelo contrário, é preciso enxergar essas influências, assumi-las, para, então, ter a condição de, a partir delas, construir algo próprio. É óbvio que a família influencia, é justamente nos laços familiares que nos constituímos. Talvez seja mais problemático quando nos pomos a negar essa ascendência, seja da parte dos pais que não falam com o filho sobre sua escolha evitando influenciar (como se fosse possível...), seja da parte dos filhos essa negação.

terça-feira, 23 de junho de 2015

NÓS, OS GERENTES

Exercendo meu hábito de leitura diária de alguns sites de notícia, que, aliás, misturam fatos relevantes da política e do cotidiano com irrelevâncias como o último ensaio fotográfico de alguma atriz, as férias de algum famoso em algum lugar do mundo, ou as fofocas acerca da vida íntima de algum ator, deparo-me com a entrevista de uma conhecida atriz global, que, além de atualizar os internautas a respeito de um procedimento estético que havia feito recentemente, comenta sobre as atribulações do dia a dia, das dificuldades que a burocracia impõe a todos nós, e tudo o mais, e acaba por comentar sobre um curso que havia feito de gerenciamento de stress, que ela passa então a elogiar e propagandear. O que me chamou atenção foi esse termo, "gerenciamento de stress". Parece que a vida contemporânea nos transforma a todos em gerentes. Desprovidos, nós, homens e mulheres da modernidade avançada, de um norte, das referências herdadas da tradição, confrontados à incessante multiplicidade de escolhas a fazer ("a vida é feita de escolhas"), à angustiante necessidade de nos fazermos a nós mesmos, de nos fabricarmos, acometidos pelo stress, pela angústia e pela insegurança, ainda assim teremos que ser gerentes... Gerentes de crise, gerentes de finanças, gerentes de carreira, gerentes de stress... A angústia dos jovens frente à escolha profissional, bem como dos adultos, profissionais maduros, está muito determinada por esse "papel" que a sociedade contemporânea lhes aponta como fundamental, esse de ser um bom gerente. Faça o que quiser, mas seja um gerente bem sucedido, a responsabilidade sobre os rumos, as estratégias e os objetivos a alcançar são de sua alçada. A urgência de sucesso, de felicidade, de soluções criativas em nossa época é realmente um importante fator de pressão emocional, de onde deriva esse interesse tão acentuado nessa figura, ou nesse papel do gerente bem sucedido.