Há, no decorrer do desenvolvimento humano, momentos de crise. Estamos habituados a associar crise com algo que não deveria acontecer, algo que se estraga, que se passa de um jeito errado ou que deveríamos evitar.
Proponho, no entanto, olharmos a crise como um momento importante, necessário ao desenvolvimento.
A crise é, sem dúvida, um momento de desacomodação. Um fora de lugar. Algo certamente veio abaixo. Digo que é importante porque muitas vezes é preciso des-acomodar, colocar abaixo para fazer um novo arranjo, ver surgir uma nova ordem.
Assim são as crises. Há muitas no curso da vida. Basta pensarmos no bebê que um dia foi um só com o corpo materno, um dia sentiu-se enlaçado nesta fusão indescitívelmente única e paradisíaca, da qual nos resta para sempre uma nostalgia. Um dia, no entanto, numa primeira crise, o bebê nasce. E chega o dia em que é desmamado, e chega o dia em que ele percebe, no espelho, a imagem de seu próprio corpo, inteiro, ao lado do adulto que lhe aponta e lhe diz: "olha lá, é você!" Momento crítico de tomada de consciência primeira de seu corpo, de sua individualidade. Vem também o dia em que esse bebê arrisca soltar-se das mãos que o amparam e inicia uma caminhada própria. O dia de sua entrada na escola, a adolescência, esta fase em que se constrói um indivíduo com sua visão própria do mundo, todos esses são momentos de crise. Algo se acaba. Algo está por ser criado. A crise é um inevitávelperder-se para voltar a encontrar-se em um novo lugar. E como gostamos de pensar que temos nosso lugar certo e garantido. Pois as crises da vida nos ensinam que viver é uma constante busca de definição desses lugares. As crises abrem sempre espaço para a criação, a renovação, a invenção de nós mesmos. De novo e sempre.
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