Contardo Calligaris, psicanalista, em seu livro “ Terra de Ninguém”, escreve assim, na crônica “A moda: belezas extremas e indecisas”:
“ Converso com um garoto de 16 anos e com sua mãe, exasperada. O garoto resolveu mudar de estilo. Jogou fora todas as suas roupas folgadas, sem pedir permissão, para prevenir uma eventual hesitação dos pais na hora de financiar a troca de vestuário.
Agora, ele quer calças estreitas e camisetas justas. O problema é que uma cena parecida já aconteceu um ano atrás. Naquela ocasião, a roupa apertada foi para o lixo- substituída por calças e camisetas que pareciam velas mestras.
A mãe: “Por que mudar, assim, de repente?” O garoto: “Agora todo mundo que é legal se veste assim.” A mãe, irritadíssima: “ Você não deveria ser você mesmo? Ter um estilo seu, sem preocupar-se com os outros?”
É fácil simpatizar com a mãe, embora não saibamos muito bem o que é “ser você mesmo.” De qualquer forma, concordemos: não é bom estar sob o domínio do que pensam os outros. Seja você mesmo, livremente,escute e respeite seus impulsos mais singulares: essa é uma das regras preferidas da modernidade. Uma outra regra diz, ao contrário: preocupe-se bastante com o olhar dos outros, pois, neste mundo, todos os cargos são eleitorais, ou seja, cada um deve seu lugar à aprovação que encontra e suscita. O garoto, mudando de estilo, busca conciliar as duas regras. Ele renova seu aspecto para ser mais “ele mesmo”. Mas precisa da aprovação do grupo das calças justas: sem o olhar dos outros, seu novo “ele mesmo” não valeu nada. ”
Pois é mais ou menos esse o impasse em que nos encontramos na sociedade consumista e espetacular em que vivemos todos nós. Espetacular quero dizer de espetáculo, mesmo. Precisamos nos mostrar, aparecer o tempo todo, “estar bem na foto”, estar de bem com a opinião pública. E ainda, uff, dizem que temos que ser nós mesmos. Essas contradições rondam nossas identidades . E é neste contexto que precisamos escolher nosso caminho, quem desejamos ser, que lugar vamos querer ocupar nesse mundo.
Este é um espaço que pretendo possa ajudar nesse processo de escolha, de tomada de decisão, de consolidação de identidade. Um espaço para a gente exercitar a reflexão sobre nós mesmos, sobre a realidade, sobre os papéis que vamos assumir para mudar o mundo.
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